Depois do descompasso, na tentativa de encontrar-se de volta, já havia se ultrapassado. Nada do que havia lhe definido poderia lhe definir agora. Nenhum sentimento, nome ou sobrenome. Era nova, era outra, era recomeço e esperança. Reinventou tudo aquilo que foi, que era e que seria.
Sorria de um jeito novo, como também eram novos os seus dias, seus planos e sonhos, seu ser. Experimentava o mundo e tudo tinha gosto de primeira vez. Sorvia cada instante, sem pressa, sem medos ou reservas e sua alma vestia-se de festa, com asas e fogos e flores nas mãos.
Desconhecia-se e, além da contradição aparente, reconhecia-se nesse lugar, como se já estivesse estado ali antes. Estava plena, segura das suas inseguranças, ciente do seu sentir, fiel ao que era agora, sem preocupar-se em definir-se. Era luz, era solar. Havia brilho nos seus olhos, paz nos seus passos e coragem para ser além das coisas.
Era oceano, imensidão e um novo continente. Era regida por uma força tremenda, uma força que nunca pensou que teria. Era prosa e poesia, sem rima ou métrica, e gestava seu futuro, desfrutando o presente. Usufruía dos pequenos prazeres e saltava de todos os abismos. Não havia fim, agora que havia descoberto novos começos.
Sua mesa era farta e permitia-se sentir por si mesma, consciente dos seus desejos, dos seus passos e não cogitava nenhuma outra alternativa que não a felicidade, a plenitude de ser. Experimentava uma felicidade nua, livre, quase pornográfica.
Construa pontes de impossíveis, via o copo meio cheio, explorava suas fronteiras. Havia chegado o tempo de crescer, florescer. E florescia por todos os lados, por dentro e por fora, até o alto, onde nada parecia poder lhe atingir. Não racionalizava, permitia-se. As estrelas moravam nela, que carregava seu próprio céu.
Vivia em seu próprio e devido tempo, em sincronia consigo, em paz com a sua solidão, suas escolhas, suas certezas e suas dúvidas. Parecia ser a hora certa, o momento exato. A vida fluía, pulsava, ardia, urgia. Nada mais poderia lhe deter: descobriu-se infinita.