O dia nasceu e passou até que o sol se pusesse. Naquele instante a cidade dormia. No reflexo da noite, via suas olheiras profundas, mais uma das marcas que ele havia lhe deixado.
As horas se derretiam num infinito amargo de lembranças doces… era sonâmbula de memórias distorcidas pelo tempo. Agora, sonhos e fatos misturavam-se, confundiam-se. Eram ondas dentro dela, explodindo em impotência e lágrimas.
Lembrava-se como sua chegada a havia feito acreditar que era possível amar para sempre e de como a história que se desenhou foi confirmando a ilusão; Ele poderia ter lhe oferecido um conto de fadas, mas havia lhe entregado toda a sua vida. Era falha e cheia de defeitos, mas ali havia sinceridade.
Naquele ponto perguntava-se porquê o tempo deles era passado e porquê tinham deixado escapar por dentre os dedos. Não lembrava se havia tomado a decisão ou se deixado levar por ela.
Mergulhou naquele homem, como se fosse o mar. Foi até as profundezas e julgava conhece-lo em todas as suas formas, sob qualquer disfarce, em cada uma de suas nuances. E, durante um tempo ela ficou realmente feliz e plena, mas ele foi saindo dela e, quando percebeu, ele já não estava mais. Sentia-se sozinha naquele mar, de repente tão revolto.
Fracassada, tentou culpa-lo. Chamou-o fraco e covarde. Pensou que tudo seria mais fácil assim… Voltou à superfície e quis respirar. Precisava de espaço.
Mas, diante da imensidão do vazio que ele havia deixado, suas certezas se invertiam, estava no vácuo que havia criado. Na ausência que lhe preenchia naquela madrugada infinita, parecia-lhe inexplicável o estado de ser dele para nunca mais.