Limpou gavetas, arquivos mortos, cheiros e saudades. Abriu as janelas e deixou a luz entrar por todas frestas, dissolvendo todos os restos de escuridão. Veio também o vento, bagunçando tudo ao seu redor. As folhas, livres, voaram feito pássaros. A poesia ganhou o ar…

Abriu portas, esvaziou cofres, queimou cartas. Varreu toda a culpa, aspirou todo o pó das lembranças. Jogou fora tranqueiras, pequenas palavras supervalorizadas em sentimentos confusos e carentes. Se desfez do que não mais lhe cabia, inclusive aquele amor.

Tomou um banho, esfregou a alma. Deixou que os restos escorressem pelo ralo. Envolveu-se na toalha, secou as últimas lágrimas. Reconheceu-se no reflexo do espelho embaçado pelo vapor. Sentiu o corpo quente, o coração latente.

Voltou à janela. Encheu os pulmões com ar puro. Suspirou leve, vazia e cheia de vida. De repente, descobriu ser a pessoa certa na hora exata, sem restos, fantasmas, desculpas ou avisos de tristeza.

Naquele instante, o sol nascia. Ali, dentro dela. A esperança lhe sorria. Ali, em frente à janela. As estrelas brilhavam. Ali, nos olhos dela. Um sentimento batia. Ali, no peito dela. O futuro chegava. Ali, bem perto dela. E nenhuma sombra do passado tinha sobrado, ali com ela.

Um comentário sobre “Dos restos e recomeços

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